Segure um trevo de quatro folhas
Adote um gato melindroso das ruas
Deite no chão de pedra no quintal
e me procure entre as estrelas
Você ainda reconhece o meu brilho
Você ainda se lembra do meu tom de voz
Então me chame pelo meu nome
Deite no sofá da sala e conte até noventa
Tome uma xícara cheia de café forte
que você mesma preparou
Procure-me pelos cantos da sua casa
ou da sua memória quase infalível
Todos eles mentiram
Eu nunca parti
Meus pedaços estão por toda a parte
Você ainda se lembra do meu tom de voz
Então me chame pelo meu nome
Baile com o meu fantasma
Faça de conta que aprendi a dançar
Intuitivamente você sabe que aprenderei
Afague seus animais com paciência
Observa a exuberância de tudo o que é verde
Procure conhecer a beleza do chão
Cuidado para não se tornar camaleão
Erga a cabeça quando o sentimento soar indizível
Nunca se esqueça de que já fez o impossível
Se o fardo for pesado, por favor, divida-o
Você ainda se lembra do meu tom de voz
Então me chame pelo meu nome
Corra para dentro do bosque
Encontre-me, quando todos me esquecerem
Pergunte para a coruja mais esperta
Estarei perto da maior das árvores
Noctívago, discreto e tangível
Ainda que seus olhos não me vejam
Suba pela escada perigosa até o terraço
Mergulhe na memória do nosso eterno tempo-espaço
Ouça o meu canto desafinado afinar o seu coração
Desfaz-se o gélido inverno na quentura do verão
Sentirá então o calor que sempre emanou de mim
Talvez sinta o aroma do meu perfume favorito
Você ainda se lembra do meu tom de voz
Então me chame pelo meu nome e eu aparecerei
Se o impossível ancorar você na Dor
Recorde-se do que é a verdadeira Beleza
O seu lema sempre foi esse Amor
capaz de superar qualquer incerteza
Então se liberte e nunca mais exista para agradar
Você se pertence e é a mesma em qualquer lugar
Você aos poucos aprende a se admirar
Livre-se de suas roupas e ande sozinha pela casa
Fite-se no espelho e se contemple pelo que é
Agora dê meia volta ou uma volta inteira
como se sentisse o giro do planeta
Escute a minha voz tecendo um elogio
Todos eles mentiram
Eu nunca parti
Vire a ampulheta
Recomece a contagem do tempo
A areia, na verdade, nunca parou de cair
Inevitavelmente estamos envelhecendo
Diga-me para onde estamos partindo agora
Você ainda se lembra do jeito que sorrio
toda vez que você se permitia ser feliz por perto
Então me chame pelo meu nome
Nunca se esqueça de que você vale tanto
quanto as pessoas que admira
E que a grandeza só tem significado
quando de dentro para fora
Apimente suas refeições
Decida se crê ou não em dragões
Cheire alecrim, orégano e manjericão
Regue o cacto uma vez por semana
A gente nem sempre destrói o que mais ama
Sopre pó de canela na sacada
em uma manhã gelada de julho
Compre abacates, tomates e cebolas
Cozinhe algo se quiser cozinhar e se não quiser
Durma, assista televisão ou leia um livro
Pule ondas quando estiver na praia
Troque as conchas de lugar
Analise a rotina de uma gaivota
Cuidado com as queimaduras solares
Não se preocupe se tomar um pouco de chuva
Olha bem para o céu quando nascer um arco-íris
Você ainda se lembra das minhas cores
Você ainda se lembra do meu tom de voz
Então me chame pelo meu nome
Dê um sorriso largo sem pensar nos enganos
Veja quanta coisa acontece em um ano
Escreva um artigo de qualidade
Pensa de uma maneira inédita
Permita-se crescer onde ninguém observa
Ouse usar palavras extravagantes e existir longe
Utilize metáforas de sobrevivência
Perdoe os erros mais drásticos,
principalmente os que você cometeu
Aqueça seus pés e o seu coração
Chame seus grandes amigos pelos nomes
Agora convoque também o seu amor
Se porventura se perder,
Você ainda se lembra do meu tom de voz
Então me chame pelo nome e eu aparecerei
sussurrando palavras belas naquele velho tom amigo
Até quando meu corpo se deteriorar
Minha alma seguirá contigo.