O cruel destino da autoidolatria eterna.

Meu sangue pinga pelo apartamento
Tinge o piso todo de vermelho
Congelam-se meus movimentos
Em face do que vejo diante do espelho

Escrevo no papel na intenção de me libertar
Ouço risinhos e cochichos aos montes
Nesta terra quase ninguém sabe o seu lugar
E eu, mesmo sozinho, vou existir longe

Distingo os tipos de sorrisos
Reconheço centenas de Narcisos
O cruel destino da autoidolatria eterna

Os bajuladores estão sempre serenos
Se fodem, se beijam e trocam venenos
Bebem com o mesmo deleite o suco, a cerveja e o esperma

Rumo.

Sinto saudade da estrada
Meus olhos castanhos escuros
chegavam nas boates e bares sempre procurando
Observava cada rachadura nos muros
enquanto a vida ia passando
Só me deparava com mentiras
espalhadas pela cidade
E eu que estava sempre na mira
Sabia que nas estradas havia
a única e esquecida verdade
Estar lúcido e sóbrio
prestes a desistir ou a admitir
É o consolo dos loucos,
Os que enxergam um pedaço da verdade são poucos
A consciência requer inevitabilidade
Quando podemos morrer a qualquer momento
somos honestos com a vida
Odeio ter a capacidade de ler as entrelinhas
Uma vez quase morri nas estradas,
E ainda assim sinto falta
das mãos no volante
E da necessidade de contar apenas
com meus reflexos para sobreviver
Qualquer caminhão ou ônibus
surgia como um monstro pesado
E eu, encolhido em meu carro branco,
antes de comprar um carro preto,
Sabia que não poderia ficar desatento
A vida é este detalhe discreto
E se dormimos na hora errada
somos esmagados como insetos
Há diversas plantações dos dois lados
e há bois e vacas e carneiros espalhados
Há também pombas que pulam no para-choque
e me pergunto se as aves se suicidam
As nuvens cinzas escolhem locais específicos para chover
E eu sinto falta do menino que eu era
antes da última primavera do mundo
Um jovem que acreditava em cartomantes,
dados viciados e na influência das marés
É estranho absorver a verdade
que o asfalto transmite
A máquina do tempo já foi inventada
É o cérebro quando estamos concentrados
em chegar em algum lugar
Qualquer lugar
Assim eu voltava brevemente
A minha prolixidade de sentidos
por vezes me fazia ficar calado
Essa prolixidade se fazia sucinta nos anos perdidos
nos quais sentia que nunca fui amado
E eu, grande mago da solidão,
carregava o charme de não ter charme,
O ar misterioso de quem não tem mistério,
O sono insistente em tudo o que me envolvia
contrastava com meu interesse imenso
em tudo o que me era alheio
E faziam filas para ter uma migalha da minha atenção
E eu olhava desinteressado e quase triste para o Vide Noir
sabendo que ninguém conhecia o buraco negro em mim
Aquela lacuna enorme que carregava tanta Dor e Beleza
sugava todas as minhas energias
Como restava algo em mim capaz
de encantar alguém?
E minhas vontades passavam
a 120km/h e eu sabia que tinha visto
muito mais do que o suficiente
E que nunca viveria o suficiente para
realizar todos os meus sonhos e desejos
Todo mundo é um, mas alguns
são um enquanto são dois ou três
Tenho me dedicado tanto
que por vezes me encontro aos prantos
quando um relâmpago lumia o breu da noite
Emociono-me diante da Beleza e sinto a sorte
de ser um homem que nunca sentiu inveja
Dirigir na estrada é
um ato contínuo de meditação
Se você tiver bons ouvidos
escutará o motor como seu coração
Os batimentos cardíacos unidos
Os radares querendo ditar limites
Os sonolentos nos tirando o ar
E os suspiros breves no peito
quando evitamos colisões e acidentes
E a consciência de que muitos outros
não conseguiram evitá-los
Viver é perigoso
Viver é raro
Viver é necessário
Se um dia tiver dúvidas sobre a vida
recomendo que dirija nas estradas
E se depare com a realidade
As mentiras, as cidades, os córregos,
os sinais de trânsito, o consumo, o dinheiro,
Isso tudo força a miopia na verdade
e deixamos de enxergar o que realmente importa
Abra as portas e janelas e veja
Ligue os faróis e encare os percursos
A vida é procurar e nunca encontrar
um rumo.

Lacuna

A lacuna da ausência aumenta
E reconheço que, até eu mesmo, falto-me
Assim, por consciência da inconsequência,
Entrego-me aos menores prazeres
Ando nu pela casa e me fito no espelho
Não tenho vergonha nem orgulho do que vejo
Nesta vida tenho sido sempre o mesmo
Pudera me entregar ao instinto ébrio
e ousar não me ser por algumas horas
Há tanta coisa que consigo com
o corpo e a mente que tenho agora
Ainda assim não quero o que posso ter
e só posso querer o que nunca hei de alcançar
A lacuna da ausência aumenta
E reconheço que agora preciso de uma cerveja
Assim, pela consciência de realizar um prazer individual
caminho decididamente até a geladeira
Sou um vexame para os outros poetas
por ser relativamente organizado
Um poeta de verdade não teria achado
tão facilmente aquilo que procura
Abro a minha cerveja preta e a bebo
e faço das goladas consecutivas
uma tradução malfeita de mim
A minha docilidade é amarga,
mas é tão fácil se acostumar comigo
que todos insistem em me querer por perto
Por não ser esperto, eu nunca consigo evitar
essa gente toda que se aproxima
Tento fugir, mas parece que é a minha sina
Há abraços e beijos em cada esquina
E eu, que por vezes reconheço que preciso ficar só,
estou quase sempre acompanhado e meu coração
é mais um balde derramado
Até a minha alma escancara minhas vontades,
entretanto, não há empatia que os faça quererem realizar-me,
Por apenas quererem-me sem realização ou ideais e propósitos
Por não quererem a mim ou de mim o que eu quero
Por se decepcionarem com o que eu mesmo espero
Todo mundo pensa que tem um conselho para tudo
e essa sabedoria falsa é uma súplica de nossas vaidades
E essa nostalgia de vontades não realizadas
Não nos fará mais realizados por fora e nem por dentro
É possível sentir orgulho dos outros, porém
o que não realizamos não realizamos
E a realização alheia não nos fará realizados
A lacuna da ausência aumenta e já não sei
Se um dia deixarei de sentir falta dos tempos de menino
Onde eu era desatento, distraído e desatino,
mas opulentamente livre como um antigo rei.

O que andam dizendo

A vida é certamente incerta,
eu disse e ela sorriu,
Depois me respondeu
com uma frase esperta
e logo então sumiu

Diga-me o que prefere:
o peso ou a leveza?
Prefiro que a vida seja leve
Já você opta pela tristeza

Bem, você precisa assimilar e saber
A melancolia era minha única companhia
Quando ninguém parecia se importar
Quando ninguém tentava me entender
É preciso ser sério nas situações sérias
e no resto do tempo buscar o riso e o prazer

Devemos nos divertir nessa vida
mesmo que nada disso seja um jogo
Tenho certeza de que não há garantias
de que viveremos de novo

Se você pausar o relógio
A vida lá fora continua,
Não seja sempre tão óbvio,
Cante hoje uma canção para a lua

Piche no muro ou na rua
Aproveite os detalhes da jornada
Sacie os seus desejos, pois logo tudo passa
A gente vem, vive, cresce e depois vira fumaça

Há convicções certeiras que esquecemos de lembrar
A vida começa, mas uma hora tem que acabar

Lá fora as pessoas desinteressantes
falam a todo instante sobre nós dois
Somos constantes amantes do agora
Nada fica para depois

Outra noite dessas saímos no escuro
Para um passeio diferente
Demos de cara com uma inscrição no muro
“Quem é que pode ver para sempre?”
Apesar disso nossos juramentos eram puros

Fodemos em todos os lugares
como uma maneira de nos afirmar
Todos os cantos da cidade, até os bares
se tornavam nosso lar
E eu ouvia sua voz melódica sussurrar:
nós fomos feitos para durar
Uma sina, um destino, duas pessoas,
Um par

Você gargalhava da intensidade do meu sentimento,
mas se aquietava quando me ouvia:
A vida é apenas movimento

E você se calava
quando alguém de repente declarava
que um dia haveria uma separação
Aquele pensamento não se enquadrava
no seu coração
Para ser sincero, confesso,
No meu também não

Os cães velhacos e sujos de barro
Os carros quase atolados
Os gatos miando de fome

O barato se tornava caro
A verdade era caso raro
E minha única oração era teu nome

Chamava-a com uma certeza ancestral
Fique
Nem tudo que acaba tem final
Acredite

Rabisquei um verso num caderno
Você me chamou de brega
Para chegar ao céu passamos pelo inferno
A beleza que importa é cega

Rimos e nos embriagamos
até que de repente houve uma briga
Não estava nos nossos planos,
mas nos afastamos pela vida

Olhares matreiros e gestos displicentes
O amor abafado pelos costumes
A gente ainda é o que sente?
O que explica tanto ciúme?

Meses, revezes, conveses
O que fazemos se tornar engano
Você entre os franceses
Do outro lado do oceano

Astronauta assando um cogumelo
Vermelho se tornando amarelo
O que nos alcança no reino do sono

A complexidade de um homem singelo
A máscara que oculta o belo
A renúncia, as denúncias, o abandono

Tudo muda de repente
E às vezes se sente o efeito
Nenhum dano é permanente,
mas algo ruim perfurou o meu peito

Ficamos por um fio, mas
Berrei pela cidade
Há conserto se ainda
há vontade

Mostre sua feiura me dê um abraço
Receba minha ternura e distorça
o tempo-espaço
A vida anda muito dura
Que saudade do seu abraço

Espalharam por aí boatos
sobre coisas que não estão acontecendo
Segura minha mão e sairemos vencendo

É necessário encarar essas afrontas,
Foda-se o que todos andam dizendo
A gente ainda se reencontra,
mesmo se acabarmos nos perdendo.

Dor no peito.

Madruga para ver o mar
Espera encontrar respostas
Quando ouve uma voz a sussurrar
no ouvido sobre uma antiga aposta

Oração insistente de marinheiro
Cada noite mais calejado e sofrido
Nunca hesita o velho timoneiro
Coração mais resistente que o vidro

Sua sorte é a descoberta da nova terra
Seu espírito livre nunca se encerra
Para tudo nessa vida se dá um jeito

Esteve em tantos lugares
E só nos mais selvagens mares
É que alivia sua eterna dor no peito.

Nunca mais saia de perto.

Pudera neste ínterim lúcido compreender
A diferença sutil dos diversos amores
Quisera neste íntegro ser surpreender
com o perfume adocicado das flores

Lumia repentinamente milhares
que jazem esquecidos na escuridão
Teus gestos simples são espetaculares
Tua presença fora de imaginação

Teu corpo me leva ao delírio
Teus olhos são o meu colírio
Personificação perfeita do meu desejo

Nunca mais saia de perto
Sem você o errado é certo
Cobre-me infinitamente de infinitos beijos.

Era uma vez.

Tantas horas tardias na madrugada
Cravam em minha pele o flagelo
Tantas doçuras agora tão amargas
Transformam fogo imortal em puro gelo 

Sinto uma espécie de autopiedade
Seguida pela raiva que advém da pena
Na memória o eterno gosto da saudade
Minha língua provando tuas lindas pernas

Tantos afagos e tantos beijos
Tantas noites de incessantes desejos
O que nunca se pode esquecer 

Gestos discretos e atitudes simplórias
O que houve e se tornou história
Quando era uma vez eu e você.

Milagre

Surge como uma espécie única
Criatura rara que prova a existência divina
Comoção alegre, objetiva e insuspeita
Personificação de um milagre
formado por mil lágrimas
Aparece como quem estreia
em uma peça teatral gigantesca
Não treme, não hesita, não se perde
Uma estrela cadente com pernas e olhos
Seus caminhos são sempre exatos,
embora nem sempre enxergue os caminhos
Suas decisões são sempre puras,
ainda que tenha tomado algumas ruins
Destas feitas choro, lágrimas e violência
Aposta na resistência e com paciência sobrevive
Continua firme, pôr do sol púrpura,
Raposa lépida, selvagem e imprevisível
Ergue a cabeça, flor do asfalto,
pois você desabrochou bela na feiura do mundo
Venceu todos os obstáculos e andou nas brasas
sem sequer ter notado que eram tão quentes
As noites de chuva querem banhar seu corpo
e escorrer por sua pele lisa
Os ecos de memória clamam por você
Chamam exclusivamente seu nome
Continua firme, anja sensual
Lusco-fusco tardio em plena meia-noite,
Ergue a cabeça, sereia cósmica
Flutua pelo Espaço Sideral como se fosse o seu Mar,
pois você é maior que todos os oceanos somados
Inunda-se pela coragem solar do pensamento reto,
Signifique sua vida fitando o rosto de sua alma
Acalme-se e busque não compreender o que não precisa
Seus caminhos são sempre exatos,
embora nem sempre enxergue os caminhos
Sinta o que tiver de sentir e saiba
Essa dor é imensa e não há onde caiba,
porém você se expande e se aprimora e evolui
Cada dia mais ampla poderá então comportar tudo
Abarca em abraços ternos novos mundos
Continua firme, fantasma feliz
Sua prole ainda chega para alegrar o Universo
Ergue a cabeça, rainha do tabuleiro de xadrez,
Não esquece que metáforas jamais são esquecidas
e que certas coisas desafiam a lógica definida
Cuida da tua saúde e tinge vidas alheias
com essa capacidade singular de amar
Lembra do Sangue que flui em suas veias
E nunca deixa de lutar
Borboleta lendária que chega da floresta,
Segue tua jornada completamente leve
Muitos por aí te carregaram e ainda te carregam
O que você obviamente não percebe
Continua lumiando o breu profundo
de quem se sente absolutamente sozinho
Nos eventos mais iracundos, isola-se,
e se permite sofrer também baixinho
Ergue a cabeça, milagre ancestral
Você é a prova de que existe um sentido
profundamente oculto na Beleza e na Dor
Milagre das mil lágrimas que nasceu neste mundo
para provar a improbabilidade do Amor.


Desastre clássico.

Desastre clássico
que faço da vida
Essa profusão
de encontros
Estes olhos
cansados e tontos
Chocam-se com impulsos
violentos e mansos
Solidão esquecida
Desastre natural
Falso desinteresse
prolixo e crescente
Tudo se revela sempre
Tudo se rebela
até o que não se entende
Luzes urbanas
Pôr do sol praiano
Gaivotas e pombas ciganas
Por quanto serão o que são
enquanto eu as chamo
Ouço o meu nome
observo de soslaio  
Por onde me esvaio
quando me derramo?
Por onde desmaio
quando sinto fome?
Por onde existo
quando o mundo
então some?
Para onde choro
se sei que secou o pranto
Para onde sigo e me demoro
quando já não sou tanto?
Não me sinto tão pronto
Troca equivalente
Verdades dissidentes
Consegui sorrir hoje
Tudo está abandonado
Certamente eu também
Andarilho distraído
Olhar canino enternecido
Invento mundos
Invernos mudos
Adesivos velhos
com colas duradouras
Na janela marca a tela
a poética da garoa
Azul e preto
Uma memória
de fevereiro
A lua no céu noturno
com a estética
de um queijo
Buquê de flores
Surpresas
O tempo
dos amores
A morte
das certezas
A apoteose
das dores
Barcos frágeis
em tempestades
Aviões bimotores
Peculiaridades
Arco-íris sem cores
Desastre clássico
de um homem salgado
Entrei no mar e
o tornei mais doce
Por quanto será
assim se o que existe em mim
fosse apenas o que fosse?
Desastre ilusório
das minhas impressões
Este caos é retórico
no reino dos corações
Cato pedaços que acho
meus e dos outros
O escape não
faz sentido
Esta rouquidão
representa pouco
Gole de café
Preguiça esticada
Acreditar no Tempo
é uma cilada
Acreditar no Tempo
é ter fé que tudo se acalma
Desgraça cósmica
Desastre clássico
Filósofos miseráveis
Corruptores endinheirados
Seres humanos vendáveis
Desastre clássico e inevitável
Sinto-me como
um lixo descartável
Horizonte plúmbeo
neste crepúsculo
Quanto mais a noite cai
Mais eu me busco
O cinza então
vira púrpura
Eu não viro
coisa nenhuma
Continuo sendo
criatura que sonda
Sente o que sente
Fantasma que assombra
E segue em frente
Fera que rosna
Cansado e exausto
Expiaria os pecados
Nunca pela confissão
para qualquer padre
Sempre como um fardo
Tudo isso e me mudo
Noutro alvorecer
Revelo a forma e o conteúdo
Farei tudo por prazer
Nunca me centrei
Talvez eu nem o saiba
um dia fazer
O universo político
ainda acontece
Domingo fatídico
que amanhã se esquece
Eu sigo prolixo
O resto se entorpece
De escolhas alheias
que não lhe acometem
Lume lunar
que hoje não vem
Fume o que fumar
não ficará bem
Cafés quentes e
bolos de laranja
Sente o que sente
e ainda se arranja
Chuta uma árvore
e colhe novos frutos
Sente o que sente
desespero mudo
Fantasma das dunas
O velho e o mar
Significo o que digo
Instinto solar
Não sei mais se devo
falar o que quero dizer
Todo mundo pensa que me ergo
apenas para ofender
E de dentro surge algo
que eu não sei nem explicar
O sol some
por completo
A tempestade
me torna discreto
Penso o que penso
sem hesitar
Pena, penso, apenso,
lápis, tinta e lugar
Lacuna imensa
Quero me afastar
Sozinho pretendo
me erguer e lutar
Samurai dos anos
Dialeto do povo
Seguro algo
secreto e novo
Antecipo o pesadelo
Desastre clássico
Não é que eu tenha medo
Só estou sorumbático
Conchas, praias, pombas,
Chuvas, assaltantes, padarias,
Pão quente, máscaras, surtos,
Pandemia, xícara, Inglaterra,
O Condado e o Japão em outras Eras
Carvalho milenar e um antigo gosto
Prosseguir é estar exposto
Existir é conhecer seu rosto
E eu continuo procurando
a face que eu tinha antes
da criação deste Universo
E me perco e me acho
na somatória dos versos
Não faço sentido e
nem preciso fazer
O que está perdido
Ainda vai aparecer
No meu caminho
Vislumbro instantes
completamente felinos
Durmo quando acordado
Vivo melhor dormindo
Infelizmente porém
Durmo apenas três horas
Outro dia estive bem
Príncipe de ontem
Fracasso de agora
Hoje estou aquém
Como tudo demora
Como muda o clima
Estou em Campo Grande
com a cabeça em Curitiba
São Paulo fura a fila
e grita o meu nome
Aqui entre nós
será só mais um homem
Sorrio e me distraio
com tudo o que acho
Quero ler aquele livro
Caprichos e relaxos
Tento ser mais vil
E continuar sereno
Minha bondade não serviu
neste mundo tão ameno
Desastre clássico
que sempre perdura
Mouses neons, pastas térmicas,
réprobos, colegas que morrem jovens,
Caixas de sons, budas, elefantes,
Chaves e pokémons e portas,
Corujas, sapos e amuletos,
Bairro da Liberdade,
cadela grande e preta,
Imaginações impossíveis
e a beleza das hipóteses
Desastre clássico
Suspiro ácido
Estrelas fixas
Constelações prolixas
Estrelas soltas
Meteoros
Rios e bares
Arrepios lunares
Santos dos mares
E eu sozinho
Este é o caminho
Esta é a missão
Toda a aposta em mim
mesmo sem cartas nas mãos
Toda a aposta em mim
Mesmo que tudo dê errado
Feiticeiras, bruxos, amores resolutos,
E o furto do Rei Diabo
O que cresce como um susto
sem nenhum suspeito
Grita aos que se fingem surdos
Não há outros jeitos
E assim vou
Como posso
Como consigo
Como devo
E não me martirizo
Deuses e demônios me observam
Como se eu fosse entretenimento
Os aeroportos perderam o charme
As pessoas perderam o encanto
Os infames seguem em vantagem
Os benfeitores nem tanto
Desastre clássico
de um futuro perfeito
Curo o que furo no escuro
faço agora do meu jeito
Sem controle de danos
Eu preciso saber se existo
Mergulho de cabeça nos planos
ou para sempre desisto
Gatas pretas, cachorros de duas cores,
chocolates amargos, malas sucintas,
Jogadores antigos e aposentados,
Raposas, panteras e a televisão
A guerra que sempre habita meu coração
Desastre clássico e o que existe dentro
Quero viver para ver além do fingimento
Borboletas com olhos nas asas
Cometas que acendem meus olhos
E me colocam em brasas
Tudo o que significa
sem nunca significar
Sigo o instinto do que sinto
Um dia me realizo
Um dia me sinto no lugar
Desastre clássico
da existência
Eu só queria ser alguém
com mais paciência.

Tanto fez, tanto faz.

Tanto fez, tanto faz
A beleza é relativa
Menos às vezes é mais
O que é belo também se finda

Por quês e por quais
Síntese profética de sina
Transformo tudo em sinais
ou simplesmente em rimas

Cresci bem e cresci forte
Porém ainda temo o escuro
Por onde passo faço minha sorte
Sentimos falta do seu barulho

Ouvi isso mais de uma vez
A insistência das palavras
Tanto faz, tanto fez
Mas o silêncio dessa casa

É que quando você some
Tudo parece esperar por você
O cachorro faz greve de fome
A gata chega a adoecer

É que mesmo quando você sai
Nem tudo você leva
O que fica nos distrai
No sapato a velha pedra

É que a vida agora me chama
para bem longe daqui
Vou atrás do que a alma clama
É o que devo a mim

Tanto fez, tanto faz
É hora de partir
Desta vez não volto atrás
É tempo de luzir.

Tanto faz, tanto fez
Adiante com o cansaço
Era uma vez minha existência
no meu próprio tempo-espaço.